Ação que reivindica terra ocupada por grande número de pessoas exige ampla publicidade

Diante do risco ao direito à moradia de um grande número de pessoas, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o procedimento previsto no Código de Processo Civil (CPC) para as ações possessórias coletivas – como a necessidade de ampla publicidade – também se aplica às ações petitórias em que figure no polo passivo uma multiplicidade de réus.

O colegiado deu parcial provimento a recurso da Defensoria Pública de São Paulo para determinar a divulgação – mediante anúncios em jornais e rádios locais e publicações em redes sociais e outros meios – de ação reivindicatória movida por uma sociedade empresária, requerendo a sua imissão na posse de um loteamento na ocupação conhecida como Cidade Satélite Íris, em Campinas (SP).

Alegando que é dona da área desde 1998 e que, desde 2016, ela é ocupada por famílias de forma irregular, a sociedade empresária pediu a condenação dos ocupantes ao pagamento de indenização no valor de 1% sobre o valor do imóvel, por mês de utilização, desde a citação até a efetiva restituição.

Diferenças e semelhanças entre ação possessória e ação petitória

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso da Defensoria e dos ocupantes do local, explicou que a posse é tutelada pelas ações possessórias; já a propriedade, pelas ações petitórias. A posse, observou, se configura pelo exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade (artigo 1.196 do Código Civil).

“Com as ações possessórias, o legítimo possuidor pretende efetivar o seu direito de ser mantido ou restituído na posse, previsto no artigo 1.210 do CC, enquanto, com as ações petitórias, o proprietário pretende efetivar o seu direito de reaver a coisa do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha, previsto no artigo 1.228 do CC. Desse modo, em ambas as situações, o respectivo legitimado ativo, ao final, objetiva, pelo menos no mundo dos fatos, a posse da coisa”, disse.

De acordo com a relatora, nas duas ações, quando o litígio envolve um grande número de pessoas no polo passivo, as consequências sociais do provimento pretendido são as mesmas, ficando os demandados submetidos ao risco de perder suas moradias – o que justifica o tratamento isonômico pelo direito processual a essas duas ações, apesar de suas diferenças.

Identidade do interesse público e social envolvido no conflito

Nancy Andrighi lembrou que o procedimento especial para os litígios possessórios coletivos não está regulamentado apenas no artigo 565, mas também – e inicialmente – nos parágrafos 1º a 3º do artigo 554, todos do CPC, tendo em vista que tratam da intervenção do Ministério Público e da Defensoria Pública, da forma de citação e da necessidade de ampla publicidade da ação.

Na avaliação da ministra, embora a ação reivindicatória seja fundamentada em direito relevante como a propriedade, ainda que o autor comprove o título de propriedade do imóvel, “a procedência da demanda não é certa, sendo possível, por exemplo, que os ocupantes comprovem o preenchimento dos requisitos para o reconhecimento da usucapião coletiva ou até a aplicação do artigo 1.228, parágrafo 4º, do CC, sendo imprescindível que os possuidores tenham o conhecimento do litígio para poder apresentar suas respectivas defesas, independentemente da ação ser fundada na posse ou na propriedade”.

Com base nisso, a relatora concluiu que o procedimento previsto para as ações possessórias coletivas (artigos 554, parágrafos 1º a 3º, e 565 do CPC/2015) se aplica às ações petitórias de mesma natureza, já que, em ambas as hipóteses, há identidade do interesse público e social envolvido no conflito, diante do risco ao direito à moradia de grande número de pessoas que integram o polo passivo da ação.

Leia o acórdão no REsp 1.992.184.

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