Tribunal confirma que militar com HIV, mesmo assintomático, tem direito à reforma por incapacidade

Em julgamento de recurso repetitivo (Tema 1.088), a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que “o militar de carreira ou temporário – este último antes da alteração promovida pela Lei 13.954/2019 –, diagnosticado como portador do vírus HIV, tem direito à reforma ex officio por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas”.

A decisão fixou o entendimento de que esse direito do militar é reconhecido “independentemente do grau de desenvolvimento da Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (Sida/Aids), porém, sem a remuneração calculada com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediatamente superior ao que possuía na ativa, se não estiver impossibilitado total e permanentemente para qualquer trabalho, na forma do artigo 110, parágrafo 1º, da Lei 6.880/1980“.

Por maioria, o colegiado acompanhou a relatora, ministra Assusete Magalhães, para quem não é necessária a modulação dos efeitos no repetitivo, uma vez que o direito à saúde, assegurado constitucionalmente, “resta resguardado na reafirmação do posicionamento anterior do STJ, ao conceder a reforma ao militar diagnosticado com o vírus HIV, ainda que assintomático, por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas, mas com remuneração calculada com base no soldo percebido na ativa”.

Controvérsia do repetitivo diz respeito ao portador assintomático

Segundo a relatora, a principal norma que disciplina a carreira militar é a Lei 6.880/1980, que, nos artigos 104 a 111, define a reforma como a passagem definitiva para a inatividade.

No artigo 108 da Lei 6.880/1980, ressaltou, estão relacionadas as hipóteses de incapacidade definitiva – entre elas, doenças especialmente graves, com ou sem causalidade com o serviço militar (inciso V); bem como há a previsão de que outras leis especifiquem outras moléstias, como é o caso da Aids, mencionada no artigo 1º, I, “c”, da Lei 7.670/1988.

A relatora explicou que a controvérsia do repetitivo dizia respeito à situação do portador assintomático do vírus HIV, ou seja, aquele em que a doença ainda não se manifestou.

De acordo com a magistrada, dadas as peculiaridades da carreira militar – e apesar dos avanços médico-científicos no tratamento da doença, ainda considerada incurável –, o STJ, a partir do julgamento dos EREsp 670.744 pela Terceira Seção, tem mantido o entendimento de que o membro das Forças Armadas portador do vírus tem direito à reforma ex officio, por incapacidade definitiva para o serviço ativo, ainda que assintomático e independentemente do grau de desenvolvimento da doença.

Exigência de invalidez para reforma do militar temporário

A ministra destacou que, antes da alteração promovida pela Lei 13.954/2019, impõe-se o reconhecimento do direito à reforma do militar, de carreira ou temporário, na hipótese de ser portador do vírus HIV, por incapacidade definitiva para o serviço ativo, conforme os artigos 106, II, 108, V, e 109 da Lei 6.880/80, combinados com o artigo 1º, I, “c”, da Lei 7.670/1988.

O advento da Lei 13.954/2019, contudo, trouxe o acréscimo do inciso II-A ao artigo 106 da Lei 6.880/1980, criando uma diferenciação, para fins de reforma, entre militares de carreira e temporários: enquanto, para os temporários, exige-se a invalidez, para os de carreira basta a incapacidade definitiva para o serviço ativo.

“Portanto, a reforma do militar temporário, com fundamento no artigo 108, V, da Lei 6.880/1980 (doenças), somente após o advento da Lei 13.954, de 16/12/2019, passou a exigir a invalidez, requisito não preenchido pelo portador assintomático do vírus HIV. Essa perspectiva da ausência de invalidez, no caso, já era reconhecida pela jurisprudência do STJ, ao afirmar que o direito à reforma do militar portador do vírus HIV, independentemente do grau de desenvolvimento da doença, dava-se por incapacidade definitiva para o serviço ativo das Forças Armadas, ou seja, por incapacidade apenas para o serviço militar”, disse.

Limites para a reforma com base no soldo do grau hierárquico superior

Assusete Magalhães lembrou que, segundo a Lei 6.880/1980, a reforma por incapacidade definitiva deve ser concedida com base no soldo do grau hierárquico superior, apenas e tão somente nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 108 da Lei 6.880/1980 – ferimento ou enfermidade contraída em campanha ou na manutenção da ordem pública.

Nas hipóteses dos incisos III, IV e V do mesmo artigo 108 (acidente em serviço; doença relacionada ao serviço e doenças previstas na legislação), exige-se, para a reforma com base no soldo correspondente ao grau hierárquico imediatamente superior, que, além da incapacidade definitiva para o serviço ativo, o militar seja considerado inválido, ou seja, que ele esteja “impossibilitado total ou permanentemente para qualquer trabalho”, na vida castrense ou civil – concluiu a ministra.

Leia o acórdão no REsp 1.872.008.

Este site usa cookies e solicita seus dados pessoais para aprimorar sua experiência de navegação. We are committed to protecting your privacy and ensuring your data is handled in compliance with the General Data Protection Regulation (GDPR).